Pampilhosa Linda

Espaço de libertação intelectual no âmbito das realidades transcendentes que ultrapassa as amplas margens da ortodoxia, com incursões na antropologia filosófica e na psicognosia, de cariz socio-cultural tenuamente perfumado com poéticas gotículas proeminentemente irónico-macónicas! Bem hajam!!!

terça-feira, outubro 18, 2005

Vida, amanhã aparece a horas!


Com a aproximação da votação do futuro Orçamento de Estado, agendada para o início da semana, retirei-me inteligentemente para um idílico burgo no sopé de uma lindíssima serra beirã. Esta incursão furtiva para a província residia em múltiplas causas de ordem emocional: segundo as minhas previsões este não seria um início de semana tranquilo. Confirmou-se! Os soberanamente eleitos, basicamente, reduziram a despesa pública de uma forma geral e iluminaram-me o futuro com mais algumas incertezas: pagarei no futuro os vícios que outros ostentaram no passado; o Sistema de Segurança Social está à beira do colapso e a sua Lei de Bases é um fraco livro de anedotas. Razões mais que suficientes para arrasar o comum mortal. Retirei-me para a província e, naturalmente, lucrei com isso! Nesta fuga furtiva levei comigo companhia; quis partilhar o momento, trocar velhas experiências. Descontraídos, fomos deixando fluir o tempo onde ele simplesmente não existe. O prazer em estado bruto! Ao serão preparei-lhe um beberete; sugeriu-me uma tertúlia. Acedi de imediato! Na sequência da conversa, os dois pela noite dentro, disse-lhe que a admirava, que me tinha surpreendido; esboçou apenas um sorriso humilde sem proferir qualquer palavra. Falámos de felicidade e trocámos angústias com a intimidade espontânea de dois velhos amigos. A existência é demasiado curta; vamos celebrar! Aconselhou-me prudência: são dois ou três os passos entre a fortuna e o abismo; mas que importa a quantidade quando a própria vida está em jogo? Que importa a Arte, a Ciência ou a Técnica? Para quê jogar aos dados quando temos o futuro? Estava definitivamente exausto. Recostei-me confortavelmente na velha poltrona a sentir o suave cheiro a café que invadia o espaço e acendi mais um cigarro; ela franziu o sobrolho, como de costume, mas continuei a saboreá-lo vagarosamente. Quis, naquele instante, reter o momento por segundos; quis, egoisticamente petrificá-lo e ser a sua própria essência. Os meus pensamentos tornaram-se suavemente desejos e sensações. Enquanto adormecia permaneceu pacientemente a meu lado, atenta a qualquer movimento, a contemplar-me os suspiros; a Vida não dorme. Adormeci com a certeza de que tínhamos encontro marcado para o dia seguinte muito embora ela me tenha ensinado a não ter muitas certezas; adormeci, inocente e feliz, com vontade de nunca ter um dia que lhe dizer adeus!

12 Comments:

Blogger Dr. Navega said...

Olha que o tabaco diz que nao faz nada bem...
Come antes um peça de fruta que te faz melhor rapaz!!!

18 outubro, 2005 14:01  
Anonymous Anónimo said...

Compartilho algumas das tuas ideias, e acrescento....
Os "privilegiados" que viram as suas reformas antecipadas ( em alguns casos antes dos 50 anos ) de empresas do estado ou do próprio estado e que agora todos vamos pagar até aos 65, vagueiam agora pelas tabernas da vila ( nem só a padaria ficou) com uma impotência serena, vendo passar os novos tempos.

18 outubro, 2005 14:36  
Blogger Gonçalo Randulfes said...

Caro Monge, a sua intervenção é inteligente e sábia! Nem tudo na vida é, porém, coerente e lógico.
Até breve.

18 outubro, 2005 15:09  
Blogger Gonçalo Randulfes said...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

18 outubro, 2005 15:12  
Blogger Gonçalo Randulfes said...

Barbeito-sangrador as suas palavras sangram de morte esta ferida que teima em não cicatrizar. São, de facto, inúmeros os casos os que caracteriza na sua intervenção. São por isso necessárias medidas urgentes num futuro próximo.
Bem Haja, prezado Barbeiro!

18 outubro, 2005 15:18  
Anonymous Anónimo said...

Caro

Alguém disse uma dia, qual verdade de La Palisse, haver mais vida para além do Orçamento.
Pudesse eu refugiar-me assim num qualquer palácio perdido, passeando triste e leda pela real mata. Num lugar onde o tempo não fosse mais do que a persistência da memória num qualquer onírico relógio. Onde não houvesse mensageiro algum para me trazer notícias desse famigerado país onde grassa a pobreza intelectual. Mas não posso! Ou não quero! Ou receio fazê-lo e não voltar mais...
Estranha forma de vida a minha...

Randulfes, se o tempo nunca a for a tempo de os alcançar nunca terá que dizer adeus...

"Passei pela minha Vida
Um astro doido a sonhar
Na ânsia de ultrapassar
Nem dei pela minha Vida"

Durma bem...

18 outubro, 2005 19:21  
Anonymous Anónimo said...

Com isto tudo até me apetece arder lentamente, rendida, ao sabor de um nostálgico cigarro.

18 outubro, 2005 19:24  
Anonymous Anónimo said...

ó randulfes gosto desse teu estilo "james dean ",felicito-o por esssa visão de interiores e estados de alma, mas a propósito gostaria de saber se o cigarro foi antes ou depois?

18 outubro, 2005 20:03  
Blogger Gonçalo Randulfes said...

Este retiro foi, estimada Inês, um bem necessário, foi saborear esse poder de eternidade que se alcança esquecendo o tempo. Não levei comigo o nosso prezado Sá Carneiro mas delicio-me com a pequena amostra com que nos brindou.
Até breve!

18 outubro, 2005 23:42  
Blogger Gonçalo Randulfes said...

A sua observação é subtil e denota malícia, ardil Sandeman! Quando o fumaria?

18 outubro, 2005 23:46  
Anonymous Anónimo said...

Leitura mais atenta ,alerta-me para o facto que dialogos com a morte são muitos na lit. universal , mas de facto dialogos com a vida... parabéns pela antitese de epitáfio.

29 outubro, 2005 20:14  
Anonymous Anónimo said...

"Passamos pelas coisas sem as ver,
gastos, como animais envelhecidos:
se alguém chama por nós não respondemos,
se alguém nos pede amor não estremecemos,
como frutos de sombra sem sabor,
vamos caindo ao chão, apodrecidos."

E.A.

01 novembro, 2005 14:42  

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