Pampilhosa Linda

Espaço de libertação intelectual no âmbito das realidades transcendentes que ultrapassa as amplas margens da ortodoxia, com incursões na antropologia filosófica e na psicognosia, de cariz socio-cultural tenuamente perfumado com poéticas gotículas proeminentemente irónico-macónicas! Bem hajam!!!

sexta-feira, março 21, 2008

Firme e o Partir das águas

Das zonas mais produtivas da Pampilhosa sobressaem a zona do Pereiro e a das Ribeiras, ambas serpenteadas pelo Cértima, rio este que permitia aguentar em regadio as sementeira de Abril até á altura das vindimas ou seja o milho, o trigo a batata, abóbora ,feijão etc.

Era comum nos anos quarenta a setenta o partir das águas, acto este, que consistia em fazer represas no Cértima de forma que entre vizinhos consecutivos a jusante fosse garantido água a todos, em pelo menos meio dia a dia e meio de água (dependendo da área de cada um) em cada duas luas e isto independentemente de ser de dia ou de noite, é claro que a água do Cértima não era muita, mas o rio nesses tempos tinha um fio de agua que corria durante o ano inteiro. De dia todos respeitavam a lei da partilha, mas quando calhavam os turnos da noite alguns agricultores relaxavam a partir das 11 meia-noites e iam embora para casa deixando a presa orientada para poço ou cisterna, ou deixando o fluir da água pelas regadeiras no campo, ou seja a rega de pé.

Sob mira da ganância de obter melhores produtos eram nestes momentos que alguns agricultores mais afoitos, acercavam-se das represas durante as 2 ou 3 da manhã e desviavam-nas, reorientando-as para os seus terrenos, antecipando assim ou voltando a regar o que era seu.

Havia um cão na família, de nome Firme, que fora educado a nunca largar o dono, ou melhor, o casaco do dono e a tornar-se agressivo quando alguém se aproxima-se do dito casaco, como estão a ver, quando calhava uma água partida durante a noite, o meu antepassado deixava um pau ou a enxada com o casaco e virava-se para o cão dizendo fica aqui firme! Firme.

O cão lá ficava junto ao casaco sendo certinho que ninguém mexia na represa, permitindo nessas noites a rega por inteiro.

Toda esta estória serviu para lembrar que antigamente havia consciência da importância da água e da necessidade da sua partilha como factor de sobrevivência e pelo facto das leis de então serem sábias equânimes .
Mas saindo da estória e entrando na história, hà milhões de anos atrás, no período Jurássico a natureza deixou-nos como feliz herança um lençol imenso de água que vai do vale poente da serra do Buçaco, Pampilhosa e Botão que se estende a sul e poente entre Condeixa até Montemor-o-Velho, circundando a poente-norte por Cantanhede, Olhos-de-Fervença e Anadia constituindo a segunda maior reserva hidrológica nacional subterrânea. (ver foto)

Basta verificar este ano a quantidade de agua com que o Certima nos presenteou para reflectir-mos do problema próximo que será o da falta deste precioso liquido , dentro de 15 anos a agua doce será mais cotada que todo o ouro e petróleo dos dias de hoje.

O que me assusta é facto das pessoas e sobretudo os políticos não terem a consciência deste bem comum que é o das águas subterrâneas, pensando erradamente que no subsolo existem as leis de propriedade que subsistem à superfície como seja , o meu poço ou o meu furo é só meu e tem mais agua que o teu ,ou o famoso:e daqui não tirarás uma gota de agua senão... ou se queres agua tens de a pagar.

Pois é meus caros patrícios , não é o leitão,o pão ou o vinho que nos sustentará no futuro.Temos uma riqueza imensa que corre debaixo dos nossos pés ,não nos lembramos dela,mas provavelmente será dela que num futuro bem próximo nos ajudará a sobreviver neste pequeno oásis.



3 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Caríssimo Randulfes

Aprecio com satisfação que o bichinho da escrita continua a formigar-lhe nos dedos.
Confesso que aprecio sobejamente quando se dedida a estas temáticas mais rurais,ou melhor dizendo, é com renovado deleite que disfruto das estórias que tira do baú das suas memórias assim ao jeito de um "TV Rural" ou de um "A Alma e as Gentes".
Graçolas à parte, o dia 22 de Março é consagrado como Dia Mundial da Água, todavia, poucas ou nenhumas são as acções que o marcam. Eu diria mesmo que no que toca às entidades estatais, a questão parece ter caído no esquecimento, restando aos pequenos eco-terroristas (como agora é moda chamar-lhes)levar a cabo algumas campanhas de sensibilização.
De facto, como muito bem alertou, a água é um recurso de fulcral importância e muitas serão ainda as guerras travadas por causa do controlo deste recurso. A este propósito podemos já analisar a forma como Israel instrumentliza os seus recursos hídricos, racionando água não só aos Palestinianos, como também, ameaça o fornecimento dos grandes rios daquela região aos seus vizinhos. A importância geopolítica da água ainda dará muito que falar...
Sabe Randulfes, tenho uma consciência ecológica particularmente sensível, para além de ser uma boa gestora dos parcos rendimentos que me são pagos pela Coroa, pelo que, há muito que a poupança de água me conquistou e espalho com grande fervor truques para reduzir os consumos.
Se me permite: a redução do caudal do autoclismo (10 litros por cada descarga!!!!) é fácil, basta colocar no depósito uma garrafa cheia de areia.
As águas cinzentas podem ser reaproveitadas, por ex., a água do banho até sair quente pode ser aproveitada para rega, para o autoclismo, para lavar roupa à mão.
Lavar os dentinhos ou fazer a barba sem ter a àgua a correr também é tão fácil...
Esta além se ser uma questão de redução da factura é também uma questão de cidadania, de zelo por um património que é de todos!!!
Esperemos que agora que a Igreja Católica decidiu considerar as questões relacionadas com a poluição como pecados mortais, as Câmaras Municipais coloquem ecopontos acessíveis em todas as Igrejas recônditas, Sés e Catedrais e que os Católicos comecem a ter uma consciência mais verde...

Cumprimentos Rand,
Muito gosto em relê-lo, sendo certo que este grafismo não foi muito do meu gosto, e que as questões com a pontuação me parecem descuidadas... mas eu compreendo, muitas solicitações, não é meu caro?

Até já
Inês

23 março, 2008 22:15  
Anonymous Anónimo said...

É sempre com enorme regozijo que leio os seus sapientes comentários Inês.

Mulher fina, de pluma caprichosa...

29 março, 2008 22:59  
Anonymous Anónimo said...

Oh randulfes esta do lençol hídrico é brilhante amigo!

E depois a inês com abordagens geopolíticas e complementa-se o ramalhete: palavras inteligentes as da nossa amiga inês.

Sempre a subir.

29 março, 2008 23:02  

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