Pampilhosa Linda

Espaço de libertação intelectual no âmbito das realidades transcendentes que ultrapassa as amplas margens da ortodoxia, com incursões na antropologia filosófica e na psicognosia, de cariz socio-cultural tenuamente perfumado com poéticas gotículas proeminentemente irónico-macónicas! Bem hajam!!!

sábado, outubro 06, 2007

O Barrasco e a Globalização


Numa recente incursão na PAMPILHOSA-ALTA deparou-se-me na frente do carro um bácoro bem constituído, bons presuntos e tomatada farta, somente conduzido por uma senhora que, com fraca cana, guiava prazenteiro porcino, de raça celta, certamente em direcção a uma impaciente porcina em pleno cio: o famoso e ancestral acto denominado chegar à porca.

Pensei então com os meus botões: ainda bem que por aqui ainda estamos bem longe da padronização pecuária global, em que contrariando a natureza do Barrasco em fecundar a fêmea, se extrai desumanamente o esperma ao bicho, que com treinadas mãos veterinárias colocam seringadas de sémen no receptáculo porcino, tudo isto com a maior das frivolidades, e sem a menor pitada de nature, mas tudo certo dentro dos trâmites das ciências escrupulosamente certas e tendo só como pano de fundo o famigerado lucro, ou seja, o objectivo da agricultura dos 27 e a dos ignotecnocratas da capital, que só conhecem o porco se estiver na travessa.

Este episódio fez-me recuar até à infância, nesses tempos em que o dinheiro e a comida, caso não escasseassem, eram pelo menos mais consciencializados. Nesses tempos o barrasco era escolhido a partir de uma ninhada, pela robustez, largura de quadris, altura de presuntos… Estes factores conferiam-lhe a honra de ser um animal só predestinado a cobrir (raramente viria a ser morto pois sua carne cheia de testosterona sabia mal); este facto, associado à poupança, obrigava à partilha do dito por uma dezena de famílias que só possuíam porcas parideiras, alimentando o porco às semanas sempre que necessitassem de o chegar às caseiras porcinas, originando sucessivas ninhadas, que sob a forma de leitão ou porco capado, se venderiam ou matariam para minguar a falta de dinheiro ou matar a maldita fome.

Lembrar que nesses tempos as pessoas tinham animais porque estes além da carne também lhes forneciam estrume para as terras, o que levaria a obter melhores cereais, milho, legumes ou frutas que seriam utilizados na engorda dos referidos animais, sendo nós humanos apenas usufrutuários dos excedentes deste fabuloso ciclo natural; nesses tempos não era agricultura, era muito mais: era etno-cultura.

Hoje o ciclo económico exige que porcos geneticamente escolhidos vivam em espaços exíguos facilitando a engorda; esta fraca movimentação origina carne mais mole e facilmente desagregada do osso, vivendo os animais em ambiente fechado raramente vendo luz do Sol o que os conduz a infecções mais frequentes e implicando recurso a antibióticos; fora o pérfido facto de serem habitualmente alimentados com desperdícios manufacturados de outras indústrias alimentares.

Por isso e para acabar com a poluição da Ribeira dos Milagres em Leiria ou outras iguais, é com raiva que digo: abaixo a nova e actual agricultura, venha daí ressurgida a nossa milenar cultura agrícola!

Randulfes 26/8/2007